Outro dia comprei um barbeador igual ao que o senhor usava. Modelo antigo, estilo ‘borboleta’, aquele em que se utiliza uma lâmina inteira. Adquiri só para guardar e recordar do guri que o observava, encantado, fazer a barba numa coreografia típica dos super heróis. Talvez nunca tenha prestado atenção, mas eu o olhava, sorria e pensava: esse meu pai é foda! E era. Fez da falta de oportunidades uma aula de como aprender a fazer de tudo um pouco. E em tudo era bom.
Seu corpo não vive mais; mas vivemos tempos em que romantizam tudo aquilo que o senhor já fazia e nós admirávamos: construía sua própria casa; ‘fazia’ o motor do carro, era o eletricista, arrumava os eletrônicos, consertava nossas bicicletas, plantava sua lavoura, cuidava dos nossos bichos, confeccionava meus trompos, queimava cal, fabricava tijolos e tinha um caminhão amarelo que transportava nossos melhores sonhos e fabricava ‘homens de verdade’, como se orgulhava em dizer.
Gostava de modas sertanejas tradicionais e ainda rasqueava o violão apenas o suficiente para galantear sua prenda. E para minha alegria, nos últimos anos de vida virou um exímio e apaixonado leitor. E a sua especialidade em arroz carreteiro?! Ainda hoje tenho em mente o sabor e o cheiro dos nossos tempos. Era o melhor carreteiro, talvez, porque precisava ser ‘bem moiadinho’.
Cresci engolindo o choro, porque qualquer reação além da voz embargada e olhos lacrimejando era um fiasco. E eu respeitava o silêncio tão educadamente solicitado (rsrsrs). Seu humor era ácido até para nos educar; e hoje virou uma memória boa que me faz sorrir. Mas, quando o senhor partiu, levou também um pedaço de mim. Naquele dia percorri cerca de mil quilômetros chorando em desespero, e o que mais eu implorei ouvir, foi “Engole esse choro guri!” Impossível!
Te amo! E hoje vou lembrar do senhor, pai, e sorrir! Minha maior homenagem!