No mundo dos negócios, a inovação é considerada um escudo contra ameaças concorrenciais.Em uma sociedade em que os desafios da produção em escala já foram superados, a capacidade de inovar emerge como diferencial de sucesso. Afinal, não é mais suficiente fornecer produtos e serviços impecavelmente padronizados e à prova de defeitos. É cada vez mais exigido que eles reflitam as necessidades, os anseios e as perspectivas de consumidores ávidos por se tornarem sujeitos.
Um dos ramos de negócios que ilustram tal transformação é a indústria da televisão. Na última década, os números do IBOPE vêm caindo consistentemente, como um reflexo desse fenômeno mais amplo, segundo o qual cada expectador quer ser único e, mais ainda, autônomo. Ele não se satisfaz mais com o conteúdo que lhe é imposto na telinha. Ele deseja escolher ao que assistir e em que momento. É então que as alternativas on-demande via internetse tornam uma ameaça para a TV tradicional.Uma vez que as oportunidades trazidas pela tecnologia aumentam vertiginosamente a quantidade de concorrentes potenciais, um desafio maior se impõe sobre a produção de conteúdo. Hoje, qualquer um é capaz de produzir um vídeo e veiculá-lo na rede. Ruíram-se as barreiras tecnológicas que protegiam o monopólio sobre a transmissão.
É preciso inovar. Mas o que é preciso para isso? Criatividade. Iniciativa. E, principalmente, autonomia. Mesmo assim, autonomia de poucos não gera a inovação de que precisamos hoje. A figura do herói – aquele que, se não nasce com autonomia, a conquista – tem um raio de ação limitado. Inovação, nas proporções que desejamos hoje, tem que partir de muitos. Muitos sujeitos autônomos, em cooperação, em prol de um bem-comum. Este último é a medida de desempenho de uma inovação. Os grandes sucessos são as inovações que traduzem demandas compartilhadas– e não aquelas meramente originais ou tecnologicamente sofisticadas, por mais que sejam geniais. Uma maneira de fazer o esforço de inovação voltar-se para o “bem-comum” é congregar a contribuição de várias pessoas.
Um exemplo. Durante meses, o país parou para assistir à “Avenida Brasil”, por onde desfilavam – não heróis – mas protagonistas. Foi uma novela praticamente sem coadjuvantes. Todos os personagens tinham uma história, uma voz, um algo mais que os fazia especiais. A construção dos personagens e a maneira como refletiam a vida real talvez fosse o que mais nos atraía para a frente da tela. Inegavelmente, aquele foi um exemplo de inovação na teledramaturgia.
Um dos segredos para esse resultado pode ser percebido na forma de atuação da diretora da novela: autonomia e cooperação. Primeiro, o autor lhe deu talautonomiaque, nos últimos capítulos, nem mais detalhava a cena, deixando isso a cargo do julgamento da diretora. Segundo, desobedecendo à convenção, a diretora incentivava improvisos dos atores e convidava a equipe técnica a dar palpites. Ela decidia, assim, pelo caminho do estímulo àcooperação entre os envolvidos na construção da obra.Tudo isso sem abrir mão de sua autoridade. Ao contrário, ela a exercia no sentido mais puro do termo: “fazer crescer”. Sua inovação “organizacional” permitiu a inovação no modo de criação.Era como se a população brasileira, em sua impressionante diversidade, estivesse representada em cada membro da equipe e do elenco. Como consequência, os brasileiros se identificaram. Sentimo-nos prestigiados: nos tornávamos protagonistas!
(*) Marcia Esteves Agostinho é Doutora em Engenharia de Produção e atua como professora e pesquisadora na Universidade Estácio de Sá
(Marciadecastro1994@gmail.com)